segunda-feira, 19 de setembro de 2011

corpototal 45



(fotografia de brassai, "torse" , circa 1934)


(a mar)

o que sobe pela chama
tem o aroma de sombra
das palavras, que ondula
no teu corpo, os contornos
dos lentos dedos na profusa
erva doente, as tuas mãos não
conhecem ainda a pele real
onde tudo se funde na visão
dos cegos até a raiz da alma
que nasce
todo o dia

ele é a onda que nos prende

saberei a força do primeiro beijo

José Gil

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

corpototal 44



(fotografia de berenice abbott, retirada )


“Eu vi a luz em um país perdido”

(In Clepsidra, Camilo Pessanha)



Ele é um tigre. O papel da fonte.
entre a água e a folha
se procuro a noite
ninguém fala dele
ocultamente


O país de minhas irmãs suavemente
Meu pai escrevia
Meu irmão escreve

Eu apenas amo tranquilamente
a ponta leve da caneta
na brisa de Leiria
maçã e laranja
formam o seu
pomar

Não sei em que mês ainda estão
O pensamento renasce
com o dia

sei, já sei que ele é o tigre de papel

José Gil

sábado, 3 de setembro de 2011

corpototal 43



(fotografia de rafael navarro, "diptico 26", 1979)


estou no declive como a santa palavra
suspensa por dentro do poema, perdi
as estrelas da garganta, adormeço no teu
seio à tardinha, adolescência e distância

quem não ouve o clamor da deusa azul
no intervalo das sílabas intactas e presentes
como se a língua tocasse o declive e o plano

quem move o corpo a sair da nuvem escura

santa palavra como se tudo ficasse por dentro
e por fora do poema como uma única montanha
as estrelas regressam à adolescência da garganta

José Gil