sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

Curto 31



(quadro de paula rego, "moon eggs", s/d)


A almas das rugas percorre Paula Rego onde o corpo jovem corre da gravidez e negro o corpo foge do cão negro como em velt literature, a parte onde te escondes a escrever – abandono e escrevo para adormecer entre duas casas de chuva, é sábado toco-te a pele da casa, a pele do regaço. Regresso onde a luz te faz vibrar a chama, atravessas agora a penumbra dos anos 80, no outro lado o edredão branco e o teu corpo negro, brilhante crespo cabelinho onde és a rua da alegria de cidades longínquas, regressa de moto ou de barco, rema o teu corpo com suaves carícias de chocolate quente, cresce para nós na luz branca da tardinha. O escrito comprime o nosso espaço. vamos nus de mota, amor, alternativa a marginal nocturna de Chopin, cão vadio, toca-me com os mamilos ao vento, prolonga-nos, vibro onde falta a luz e a palavra em fogo caminha na tua chama com o comboio de crisântemos e jasmins. escrevo na maior desordem. as ilusões são tão impossíveis como imorais, mesmo quando corro atrás, nas árvores de copa nocturna, allegro, delas cegamente no paredão junto à areia de madrugada, toca-me os seios nas costas e perco a pele, dispo-a e fico com os órgãos todos à luz da luz, vibro o cio do corpo aberto ao creme de chocolate no uivo e na casa. Estou rendido á terra que sabe que eu estou perdido nesta rara, raiva, ruidosa. A tinta do meu computador és tu num incerto movimento são os cristais do ciúme. Quero a terra nova, a sombra fria, mordeu o meu vermelho coração, o drácula espera-me em Sibius na Roménia das minhas ilusões arquitectónicas e os lábios maiores e as línguas sem deixares por isso de ser Deus. Segura-te à estaca do coração negro de uma caixa de fósforos móvel espalhada ao vento como as tuas ancas sobre pequenos pêlos de gente singular. Os lábios acendem novamente o mel.

Estou só no mundo, como sair daqui para ali. tudo se explica, vês aqui a grande máquina de amar. Este poema cresce-me nos cotovelos. Nunca choro, a sombra fica no lugar dos vivos inocentes, não há sodomia sem ser no poder, não há poder nenhum se ninguém morre, apenas um labirinto sensível de uma gelatina com pontos ásperos, apenas um labirinto das portas de sol. Amo-te na íntima agonia plenamente perdido.

Beijo os cones e lanças as garras aos joelhos. Eu contemplo-te e beijo os pés e falo-te.

Ouves ainda o murmúrio na penumbra, sentes os meus dois dedos bem dentro e lentos, revelo-te que vou escrevendo outro poema elo de uma cadeia de vários poemas curtos no seu toque, no seu tempo, escrevo directamente num espasmo curto, num sopro contínuo. Tudo isto é simples como a paixão. Curtos. Sinto na língua os teus crespos no lugar dos fios de ouro, sou o teu palco ou já não fosse o meu amor, a pele, o pêlo, o sangue, o músculo. Abro o caderno dos apontamentos e o computador. A minha caligrafia é infantil como o teu sorriso adulto e maduro. Sorri outra vez. os acasos só são por vezes acasos. Ilustra-me os dedos ao abandono, estar aqui ou não estar. Abre a porta, e digo-te hoje não há sorvetes amor só cinzas dos vivos.

José Gil

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